É o Lua!!! Emblemático negro de terno cinza, de movimentos lentos, vaidoso e querido pelas pessoas
As crianças de minha geração não tinham tanta informação quanto as de hoje. E quando criança eu tinha medo de algumas pessoas que andavam pela cidade. Chamávamos essas pessoas de "loucos". Sim, um termo politicamente incorreto para os dias de hoje, mas não na minha infância.
Hoje sabemos que são pessoas especiais, portadoras de alguns distúrbios mentais ou comportamentais que, num estágio mais severo, podem se desligar da realidade e serem marginalizadas, algumas por puro preconceito. Antigamente isso era muito mais forte do que é hoje.
Não sei se tinham algum tipo de distúrbio mental algumas pessoas que perambulavam pela Morada do Sol no período de minha infância, mas meu imaginário pueril me fazia ter medo de várias delas. Quando passavam pela calçada, muita criança morria de medo e corria. Eu também, é claro. Lembro-me do Miquelin, do Irço (Wilson no caipirês), da Nena Paulada e do Lua.
É! O Lua! Ele mesmo!
Uma figura dócil e querida em Araraquara, mas não era assim para mim nos meus 8, 9 anos de idade. Eu me pelava de medo do Lua quando o via pelas ruas com seu andar vagaroso e trôpego. Foi um dos fortes registros que guardei da minha infância.
Bem, mas o que isso tem a ver com a Ferroviária?
É que em 1985 eu virei Encarregado de Arrecadação da Federação Paulista de Futebol e era então o responsável pela distribuição, arrecadação e fiscalização dos ingressos e dos estádios. Viajava pelas cidades do interior com equipes de fiscais para disciplinarmos as portarias de alguns estádios, que tinham verdadeiras gangues operando nas catracas.
Foi nesse ano de 85 que a Ferroviária fez uma campanha empolgante que a levou a disputar as semifinais com a Portuguesa em jogos de ida e volta. O primeiro foi num domingo, dia 8 de dezembro de 1985, na Fonte Luminosa. Vou falar desse episódio mais especificamente numa outra coluna, mas aconteceu um fato digno de registro antes dessa partida.
Cheguei cedo com os fiscais e minha função era vistoriar tudo o que acontecia dentro e fora das quatro linhas do campo de jogo. Uma festa em Araraquara, a Fonte iria encher e o jogo era de segurança máxima, pois a Portuguesa e a F.P.F. temiam qualquer tipo de pressão que pudesse ocorrer. Nossa torcida era conhecida por alguns históricos de “intimidação” contra os trios de arbitragem e todo cuidado era pouco.
Quando subi ao gramado, os portões já estavam abertos havia algum tempo e o povo não parava de chegar, minha emoção era imensa em coordenar esse trabalho justamente no estádio em que comecei a assistir aos jogos na infância e quando olhei para o túnel de entrada dos vestiários, levei um susto, arregalei os olhos e perguntei aos gritos a um membro do estafe da Ferroviária, apontando com o dedo:
– O que aquele cara está fazendo ali?
Onde de imediato meu interlocutor respondeu:
– Quem? Ele? Mas ele é o Lua!
– Por isso mesmo! É o Lua!!!! – Bradei.
– Então... mas o Lua é da Ferroviária... Ele toma conta do vestiário...
Fiquei perplexo com a situação, porém percebi um inconformismo de todos com a minha cisma com aquela figura pacata ali atrás, e que não faria nada demais que pudesse atrapalhar o bom andamento de uma partida tão importante.
Tive que me render à realidade e passar por cima de dogmas infantis para perceber que aquele emblemático negro de terno cinza, de movimentos lentos e muito vaidoso era muito querido pelas pessoas. Vivia na Pensão do São Geraldo e fazia parte da vida da Ferroviária como uma figura folclórica até. Convenceram-me de que era uma boa alma. E inofensiva, ao contrário do que ficara marcado até então para mim.
Vieram muitas emoções nesse dia, mas eu me lembro de que fiquei satisfeito em conhecer um pouco da figura do Osvaldo Salvador. A ele e às demais pessoas especiais o meu carinho e respeito.
Data: 13/02/2012 às 20:45 h
Local: São Paulo - SP
Autor: Paulinho Vidal
Fonte: http://
As crianças de minha geração não tinham tanta informação quanto as de hoje. E quando criança eu tinha medo de algumas pessoas que andavam pela cidade. Chamávamos essas pessoas de "loucos". Sim, um termo politicamente incorreto para os dias de hoje, mas não na minha infância.
Hoje sabemos que são pessoas especiais, portadoras de alguns distúrbios mentais ou comportamentais que, num estágio mais severo, podem se desligar da realidade e serem marginalizadas, algumas por puro preconceito. Antigamente isso era muito mais forte do que é hoje.
Não sei se tinham algum tipo de distúrbio mental algumas pessoas que perambulavam pela Morada do Sol no período de minha infância, mas meu imaginário pueril me fazia ter medo de várias delas. Quando passavam pela calçada, muita criança morria de medo e corria. Eu também, é claro. Lembro-me do Miquelin, do Irço (Wilson no caipirês), da Nena Paulada e do Lua.
É! O Lua! Ele mesmo!
Uma figura dócil e querida em Araraquara, mas não era assim para mim nos meus 8, 9 anos de idade. Eu me pelava de medo do Lua quando o via pelas ruas com seu andar vagaroso e trôpego. Foi um dos fortes registros que guardei da minha infância.
Bem, mas o que isso tem a ver com a Ferroviária?
É que em 1985 eu virei Encarregado de Arrecadação da Federação Paulista de Futebol e era então o responsável pela distribuição, arrecadação e fiscalização dos ingressos e dos estádios. Viajava pelas cidades do interior com equipes de fiscais para disciplinarmos as portarias de alguns estádios, que tinham verdadeiras gangues operando nas catracas.
Foi nesse ano de 85 que a Ferroviária fez uma campanha empolgante que a levou a disputar as semifinais com a Portuguesa em jogos de ida e volta. O primeiro foi num domingo, dia 8 de dezembro de 1985, na Fonte Luminosa. Vou falar desse episódio mais especificamente numa outra coluna, mas aconteceu um fato digno de registro antes dessa partida.
Cheguei cedo com os fiscais e minha função era vistoriar tudo o que acontecia dentro e fora das quatro linhas do campo de jogo. Uma festa em Araraquara, a Fonte iria encher e o jogo era de segurança máxima, pois a Portuguesa e a F.P.F. temiam qualquer tipo de pressão que pudesse ocorrer. Nossa torcida era conhecida por alguns históricos de “intimidação” contra os trios de arbitragem e todo cuidado era pouco.
Quando subi ao gramado, os portões já estavam abertos havia algum tempo e o povo não parava de chegar, minha emoção era imensa em coordenar esse trabalho justamente no estádio em que comecei a assistir aos jogos na infância e quando olhei para o túnel de entrada dos vestiários, levei um susto, arregalei os olhos e perguntei aos gritos a um membro do estafe da Ferroviária, apontando com o dedo:
– O que aquele cara está fazendo ali?
Onde de imediato meu interlocutor respondeu:
– Quem? Ele? Mas ele é o Lua!
– Por isso mesmo! É o Lua!!!! – Bradei.
– Então... mas o Lua é da Ferroviária... Ele toma conta do vestiário...
Fiquei perplexo com a situação, porém percebi um inconformismo de todos com a minha cisma com aquela figura pacata ali atrás, e que não faria nada demais que pudesse atrapalhar o bom andamento de uma partida tão importante.
Tive que me render à realidade e passar por cima de dogmas infantis para perceber que aquele emblemático negro de terno cinza, de movimentos lentos e muito vaidoso era muito querido pelas pessoas. Vivia na Pensão do São Geraldo e fazia parte da vida da Ferroviária como uma figura folclórica até. Convenceram-me de que era uma boa alma. E inofensiva, ao contrário do que ficara marcado até então para mim.
Vieram muitas emoções nesse dia, mas eu me lembro de que fiquei satisfeito em conhecer um pouco da figura do Osvaldo Salvador. A ele e às demais pessoas especiais o meu carinho e respeito.
Data: 13/02/2012 às 20:45 h
Local: São Paulo - SP
Autor: Paulinho Vidal
Fonte: http://
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