quarta-feira, 13 de março de 2013

Lendas e mitos do fundador de Araraquara - Pedro José Neto


Beto Caloni

A História da Estória - A Lenda do 
Fundador Criminoso


A história das localidades geralmente é escrita por amadores sem qualquer preparo. 
Ainda que bem intencionados, é comum cometerem erros que se eternizam, pois viram fontes 
de informações para as gerações futuras. A lenda de que Pedro José Neto era um criminoso 
fugido da justiça é um exemplo disso. Foi em 6 de março de 1881 que circulou primeiro jornal 
em Araraquara – “O Município de Araraquara” - editado por José S. Góis. Na verdade, no 
dia 27 de fevereiro, para testar a impressora, foram impressos três exemplares. O historiador 
José Ferrari registrou que antes mesmo desta data, circulou na então Vila, um jornal 
manuscrito, mas que não passou de poucos exemplares e nem restou provas disso. Mas a 
história de Araraquara nasceu em 18 de janeiro de 1885, no dia em que se comemorou a 
inauguração dos 128 quilômetros de trilhos ferroviários ligando São Carlos à Araraquara. Foi 
nesse dia que se publicou pela primeira vez um texto sobre o passado da então Vila, na época 
com 68 anos. Essa inauguração era demasiadamente importante para a Vila e a edição 
especial do jornal local ajudaria a dar pompas ao evento que simbolizava o ingresso de 
Araraquara no futuro, agora ligada ao mercado internacional – um sonho destilado por seis 
décadas de isolamento e distância do porto. Neste dia a comitiva inaugural saiu da capital pela 
manhã, almoçou em Rio Claro e, às 10h45 seguiu viagem, inaugurando o novo trecho. 
Lideravam as autoridades, o presidente da Província, José Luís de Almeida Couto e o Conde do 
Pinhal, Antonio Carlos de Arruda Botelho, este, cumprindo a promessa feita há exato um ano. 
O trem inaugural chegou às 16 horas e foi recebido com fogos de artifícios, banda de música e, 
toda a região da nova estação estava enfeitada com “arcos e galhardetes”. O contratempo 
ficou por conta do temporal que caiu neste dia, quase acabando com a festa organizada por 
uma comissão presidida pelo Cel. Carlos Baptista Magalhães e que dias antes percorreu a Vila, 
solicitando a capinação das ruas e que todos mantivessem suas casas iluminadas, já que a 
iluminação a querosene só seria instalada no ano seguinte, meses antes do Imperador visitar a 
Vila. O presidente da Província ficou hospedado na residência do Comendador Antonio 
Lourenço Correa e à noite foi homenageado com um lauto jantar seguido de um baile na casa 
de Dª Maria Vaz de Arruda Ferraz, que tinha uma grande sala e servia para as atividades 
sociais da Vila e onde teve origem o Clube Araraquarense. De autoria do advogado e político 
Dr. Manuel Augusto Alvarenga (genro do Capitão Francisco de Paula Corrêa da Silva), esse 
primeiro texto da história local foi escrito com informações que o autor obteve com os 
moradores mais antigos e lúcidos. Não se sabe como, mas essa “reportagem” não foi 
devidamente checada e por isso deu origem a um mito sobre Pedro José Neto, o eventual 
fundador da Freguezia. Foi nessa edição especial que surgiu a lenda de que Pedro era fugitivo 
da justiça de Itú e vivia nesta região escondido e, por isso, é considerado o pioneiro. A “lenda” 
afirma que Pedro José Neto, aqui, chegou por volta de 1790, fugido da Justiça, e vivendo 
escondido tomou posse de oito sesmarias.
Anos depois foram chegando outros pioneiros e obtiveram de Pedro, sesmarias em 
troca do silêncio sobre seu paradeiro. O Dr. Augusto (que assinava M. Alvarenga) não revela 
que crime Pedro teria cometido, nem onde, nem quando e, estranhamente, não se constrange 
ao afirmar que os patriarcas das principais famílias de fazendeiros conseguiram suas terras 
“extorquindo” o pobre Pedro. Só que Pedro não possuía terra alguma, tanto que em 1809
 solicitou uma sesmaria alegando estar na região há dois anos (1807). Portanto, não estava 
escondido de ninguém, já que fez a solicitação ao governo e com isso informava onde estava. 
Mais estranho ainda é a confirmação dessa gafe por Bento de Abreu no Álbum de 1915. Está 
lá, na pág XIII: “(…) Quanto à descoberta das terras, parece certo que em 1790, Pedro José 
Neto, fugindo de Itu, por motivo de crime, internou- se nas mattas onde hoje está São Carlos 
e, depois de percorre- la em várias direcções, descobriu os campos de Araraquara”. Fugindo 
sempre às justiças de Itu, explorou a campanha e estabeleceu as posses de Ouro, 
Rancho Queimado, Cruzes, Lageado, Cambuhy, Monte Alegre, Bonfim e fixou 
residência em Monte Alegre. Tendo aparecido novos exploradores, Pedro José Neto 
repartiu com eles o seu domínio e, com a condição de o livrarem das justiças de Itu, 
cedeu a diversos a maior parte das terras que possuía; ao major Duarte, vendeu 
Monte Alegre e fez doação das posses de Ouro, Cruzes e Rancho Queimado; a João 
Manoel do Amaral, a do Bonfim; a Domingos Soares de Barros, a do Lageado e ao 
Coronel Joaquim Moraes Leme, a do Cambuy”. A quantidade de erros e equívocos 
existentes neste trecho de Bento de Abreu exemplifica como a história sempre foi deturpada, 
ainda que sem intenções, desonestas. Vejamos:

Parece certo que em 1790, Pedro José Neto:

Na década de 1930 o historiador José Ferrari esclareceu essa data, através de uma 
declaração do próprio Pedro José Neto, em 1809, quando requereu sua sesmaria. Disse ele 
que estava na região, há dois anos, ou seja, desde 1807. Ao afirmar que foi em 1790, Bento 
de Abreu estava repetindo M. Alvarenga, que por sinal, assim como Bento de Abreu, não era 
araraquarense.

Fugindo de Itu, por motivo de crime.

Confirma o erro de M. Alvarenga, pois ao pedir uma sesmaria ás autoridades de Porto 
Feliz e Itu, Pedro não estava se escondendo de ninguém. E, quando o Procurador da Coroa e 
Fazenda, José Arouche de Toledo Rendon, conhecido por sua seriedade, solicitou mais 
informações sobre os requerentes, a Câmara de Itu informou que os três requerentes (Pedro e 
seus dois filhos José e Joaquim) eram pessoas dignas. Existe um abaixo-assinado datado de 
1813 que contém 18 assinatura (entre elas a de Pedro José Neto). Esse documento chegou a 
ser considerado uma pista do tal crime que não aconteceu, mas a assinatura de Pedro aparece 
em meios as demais e não sugere ser réu ou acusado, pelo contrário – alguém inteirado com o 
desenvolvimento da região. O historiador Alberto Lemos chama a atenção para o fato de que o 
degredo era uma pena para crime grave o suficiente para merecer um registro. Através dos 
anos vários historiadores procuram a tal prova (as peças do alegado processo criminal). O 
próprio Lemos procurou minuciosamente no Departamento de Arquivo do Estado de São Paulo 
e nada encontrou. Em Itu, quem procurou exaustivamente foi Jarbas Silveira Arruda, titular do 
Primeiro Tabelionato da Comarca de Itu. Um araraquarense que viveu ali toda a vida e teve 
tempo de fazer essa busca, não apenas por motivos próprios, mas também por ter sido 
solicitado por vários conterrâneos. Apesar de tanto empenho nessa procura, nada encontrou.

Internou-se nas mattas onde hoje está São Carlos….

Em 12 de agosto de 1784 Pedro se casou com Inácia Maria em Barbacena (MG). Na 
tramitação burocrática da sesmaria que solicitou aqui, em 1809, a Câmara de Itu informou ao 
Procurador da Coroa e Fazenda, José Arouche de Toledo Rendon que ele, Pedro, “passou de 
Minas para este sertão”. Ou seja, uma pista de que ele veio de Minas e não de Itu, onde 
não existe registro (nos censos de 1884 a 1809) da presença dele nem como visitante, nem 
como morador, nem como criminoso. E, depois de percorre-la em várias direcções, descobriu 
os campos de Araraquara Os tais Campos de Aracoara, nada mais são que o encontro de dois 
ecossistemas a Mata Atlântica e o Cerrado. Para quem vinha de São Paulo, passando por São 
Carlos, os campos começavam a se manifestar na altura de Itirapina.

Major Duarte e Coronel Moraes Leme

Essas patentes (major e coronel) pertencia à Guarda Nacional, instituição criada mais 
de duas décadas depois. Em Araraquara, as primeiras dessas patentes, só foram solicitadas 
em 1839.

Estabeleceu as posses de Ouro, Rancho Queimado, Cruzes, Lageado, 
Cambuhy, Monte Alegre, Bonfim e fixou residência em Monte Alegre…

Pedro José Neto não tinha posses nem prestígio nem condições de tocar uma sesmaria 
sequer, quanto mais oito, considerando que cada uma tinha, em média, 5.400 alqueires. Um 
exagero, pois oito sesmarias significaria um total de 24 léguas de frente (144 kms) por 8 
léguas de fundo (48 kms). Ele não conseguiu prosperar a única sesmaria que ganhou, 
vendendo- a bem barato ao pai do Padre Duarte Novaes. Por isso, Pedro não poderia ter 
tomado posse de nada e, muito menos, ter cedido áreas a terceiros. Por exemplo, seis meses 
após a concessão dada a Pedro José Neto, o sargento mor Joaquim Duarte do Rego também 
pediu terras na região e obteve uma sesmaria contígua a de Pedro. No pedido esclareceu que 
eram terras devolutas, ou seja, não pertencia a ninguém. Logo, não foi Pedro que lhe deu. 
Quando M. Alvarenga escreveu o primeiro texto da história local Araraquara tinha 68 anos e 
provavelmente, alguém remanescente da época da demarcação das sesmarias (1812-1919), 
ou o filho de alguém que conheceu Pedro José Neto. O próprio Bento de Abreu demonstra 
como isso era possível ao afirmar (pág XIV): “Segundo a tradição oral e, pelo que 
encontramos escripto, e ouvimos pessoalmente confirmado pelo Sr Capitão Antônio Lourenço 
Corrêa, que ouviu de seu pai Commendador Joaquim Lourenço Corrêa, que para aqui, se 
mudou em 1840, e este de seu avô Sargento-Mor José Joaquim Corrêa da Rocha, que aqui 
esteve em 1812, como juiz das medições….” Essa “lenda do Crime em Itu” foi se perpetuando 
desde que esse primeiro texto (de M. Alvarega) passou a servir de matriz para os demais 
escritos a partir daí. Por exemplo foi reproduzido em 16/ 09/1894, no jornal Correio de 
Araraquara e mais tarde republicado em outros órgãos da imprensa, inclusive da capital. Bento 
de Abreu Sampaio Vidal se baseou nesta versão fantasiosa quando escreveu o Álbum de 1915, 
que serviu por décadas como fonte oficial da cidade. Por mais de um século, na época do 
aniversário da cidade, voluntários “letrados” se propunham a colaborar com a imprensa, 
sempre repetindo a mesma versão inventada. Sem nenhuma pesquisa, nada acrescentavam à 
elucidação do fato histórico. Em alguns períodos esses “cronistas do acaso” chegavam a 
imaginar versões para o pioneirismo de Pedro José Neto, descrevendo com detalhes a epopéia 
da chegada, com a família e a conquista da terra como num filme de Hollywood. Enfim, a 
incompetência bem intencionada de um advogado gerou uma versão fantasiosa da nossa 
história e ao longo de 124 anos, outros incompetentes bem intencionados ajudaram a 
perpetuar essa mentira. O que mais chama a atenção é que não existe nenhum indício do tal 
crime que Pedro teria cometido. Mas é do conhecimento de todos que uma mentira quando 
repetida muitas vezes, vira verdade. È uma pena, mas isso continua acontecendo….

Coincidências de Datas

A Iluminação pública foi inaugurada também num 22 de agosto, mas em 1909, quando 
ainda não se comemorava o aniversário da cidade. Mera coincidência. Foi também num 22 de 
agosto, em 1942, que o Brasil entrou na II Guerra Mundial, quando Araraquara comemorava 
125 anos. Resolveu declarar guerra ao Eixo porque um submarino alemão U-507 afundou cinco 
navios brasileiros na nossa costa, dentre eles um chamado “Araraquara”, com 131 tripulantes 
mortos.

Rio, Ilha e Serra

Pouca gente sabe, mas existe um rio chamado “Araraquara”, correndo a nor-nordeste 
do estado, na região de Cajuru e Santo Antônio da Alegria, quase na divisa com Minas Gerais e 
tem a largura aproximada do nosso Jacaré. Já em 1766 figurava na carta geográfica que 
traçou, grosseiramente, a “Rota dos Goiases”. No Espírito Santo tem um outro rio chamado 
Araraquara, assim como uma serra no Amazonas e uma ilha no Rio de Janeiro, próximo à 
Paratí.

Ampulhetas de Gelo

Antigamente fazia muito mais frio, como dá pra notar, por exemplo, na nota publicado em 
9/6/1904 no jornal “O Popular”: “Foi rigorosa a madrugada que abateu sobre a região na 
madrugada de ante-hontem. No alvorecer, um alvo lençol de neve cobria as pastagens da Vila 
Xavier. Próximo à estação ferroviária, ampulhetas de gelo recepcionaram o sol tímido” Nas 
madrugadas de 23 a 27 de junho de 1918, assola o estado a chama “geada negra”. O 
termômetro chegou a registrar quatro graus negativos. Houve manifestações de neve em 
alguns pontos da capital (e seguramente do estado). Esse queda de temperatura “queimou” 
cerca de 40 % dos cafezais paulista e adiou uma década a queda do complexo cafeeiro. Antes 
dessa geada de 1918, as maiores geadas foram a de junho de 1870, maio de 1886 e agosto de 
1902. Nota-se um intervalo de exatos 16 anos entre cada uma.

Texto de Beto Caloni



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